terça-feira, 2 de agosto de 2011

Devarim - Energia Semanal de 31/07 a 06/08

Esta semana lemos o primeiro trecho do último livro da Torá, o Deuteronômio. A Porção Semanal se chama Devarim (Deuteronômio 1:1-3:22).
Moisés, sabendo que está chegando o momento de sua morte, e sabendo que não vai entrar na Terra Prometida, começa a fazer um discurso ao povo, dando-lhes os últimos conselhos. Dá para imaginar a importância das palavras que vêm a seguir? Fica até difícil escolher um ponto a discutir, mas eu queria falar de um conselho especial que Moisés dá ao povo, logo no início do seu discurso: “Ouvi a causa entre vossos irmãos, e julgai com justiça” (Deuteronômio 1:16).
Uma das primeiras coisas que Moisés pede é que o povo aprenda a prestar atenção nos seus companheiros. O mandamento é aparentemente simples, pede só que ouçamos o que os outros têm a dizer, mas, na prática, quão complicado é isso!
Ouvir é diferente de escutar. Ouvir envolve uma atitude ativa, de escutar (atitude passiva) o que outro tem a dizer, mas também levar em consideração o que assim foi ouvido. Ouvir é aceitar a pluralidade do mundo, é reconhecer e conviver (no sentido mais profundo desta palavra) com as opiniões alheias e divergentes da nossa. Ouvir envolve também, obviamente, permitir que o outro termine a sua fala sem interrompermos. É aquela velha história: por isso temos dois ouvidos e uma boca. Deveríamos falar só a metade de tudo aquilo que nos permitimos ouvir.
Curiosamente, a palavra em hebraico para ouvir é relacionada à palavra “equilíbrio (lehaazin e izun, respectivamente). Sabemos que a nossa sensação de equilíbrio interno é dada pelo labirinto, uma estrutura que fica nos nossos ouvidos. Do mesmo modo, é o ato de ouvir que permite a criação do equilíbrio entre as pessoas.
É claro que precisamos enfatizar que o “ouvir” aqui nada tem a ver com abrir mão dos próprios princípios ou crenças fundamentais. Muito pelo contrário, a Cabalá sabe que um mundo saudável e equilibrado vem justamente da oposição entre ideias, da capacidade de que todos pensem de modo diferente, mas que, ainda assim, se ouçam.
Para ensinar esta ideia, os sábios do Talmud (Taanit 20) nos dizem que “o homem deve ser sempre mole como o junco e jamais duro como o carvalho”.
Será que isso quer dizer que o homem deve ser submisso e moldar suas ideias de acordo ao bel-prazer do outro? Obviamente, não! Isso fica evidente quando lemos a continuação da explicação dos sábios:
“O junco fica em lugares alagados, possui muitas raízes, e mesmo que todos os ventos do mundo venham e soprem sobre ele, não o movem de seu lugar. Ele apenas vai e volta com os ventos. Silenciaram os ventos, ele volta a ficar parado em seu lugar. O carvalho – todos os ventos do mundo sopram sobre ele e não o movem de seu lugar. Vem o vento sul, que é especialmente forte, e arranca-o, fazendo tombar sobre sua face”.
O junco e o carvalho são uma metáfora na obstinação aos nossos princípios. Devemos sempre nos enraizar no que acreditamos e nos nossos princípios, mas nunca a ponto de ser derrubado com os ventos mais fortes (as falas mais pungentes dos outros). Devemos saber manter o equilíbrio ouvindo sempre os outros, deixando que o vento da fala do outro passe por mim sem me desestruturar. É quando eu aprendo a manter o equilíbrio interno que o estado de ouvir de modo saudável pode surgir.
Mas, para encerrar a discussão, por que é tão difícil ouvir ao outro? As próprias palavras de Moisés dão a resposta: “Ouvi a causa entre vossos irmãos.” A dificuldade advém do fato de que não vemos o outro como um “irmão” de fato. A dificuldade de ouvir ocorre quando eu olho o outro e me sinto alienado dele, uma entidade a parte, com fronteiras definidas que precisam ser guardadas, tal qual uma cidade. Se a minha visão fosse de integração e eu passasse a enxergar o outro como parte de um todo maior, de uma grande família, certamente o ouvir viria com mais facilidade!

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